sábado, 31 de outubro de 2009

Dança com o viés político


Caderno Viver, Diário de Pernambuco.
Por Tatiana Meira - Diário de Pernambuco (31/10/2009)

"Um projeto inédito no Recife termina hoje, com conferência de Isabelle Launay, professora e co-diretora do Departamento de Dança da Universidade de Paris 8, na Aliança Francesa, no Derby, às 17h. Articulações - Corps en Temps representa novidade por ter proporcionado três semanas de experimentação continuada numa oficina para um grupo de 15 criadores em dança, com técnicas nunca antes ensinadas na cidade, como o método Feldenkrais. E por ter possibilitado a apresentação no Teatro Hermilo Borba Filho do espetáculo A vida enorme - Episóde 1, de Emmanuelle Huynh, trabalho desenvolvido no Centro Nacional de Dança Contemporânea de Angers, na França, um dos pontos de vanguarda na formação e criação em dança na Europa.

A visão de fronteiras ampliadas ou borradas entre as artes integra a filosofia do Centro de Angers, onde o coordenador do Articulações, o pernambucano João Costa Lima, estudou por um ano, dos cinco em que vive na Europa. "Queria trazer esta experiência para cá, encarando a performance da dança a questões estéticas e políticas, levando em conta os pilares da experimentação, criação e formação", aponta João Lima, que ministrou o módulo de Observatório cenográfico, ao lado do artista plástico e cenógrafo francês Johann Maheut.

Elementos como espaço e sensorialidade e as relações entre o bailarino e ele mesmo, o outro e os outros foram alguns dos pontos explorados durante a oficina, que ocorreu no Espaço da Compassos, no Bairro do Recife e deixa como uma de suas sementes um blog, que continuará ativo ao término do curso (www.articulacoesblog.blogspot.com). "Fizemos exercícios simples, como o de composição com objetos como mesa, cadeira e lâmpada. Quando o bailarino se coloca numa posição específica, isto estabelece uma relação com o público e o imaginário que pode surgir a partir daí", descreve Johann Maheut.

Para Liana Gesteira, uma das bailarinas participantes da oficina e integrante da Cia. Etc., o mais pertinente nas três semanas de trabalho é poderarticular pensamentos por perspectivas diferentes, trabalhando a composição da cena na dramaturgia, algo que falta aos profissionais do Recife, por não estarem acostumados a desenvolver esta criatividade", opina. Juliana Japiassú defende que o Articulações foi importante para aguçar o olhar dos participantes, que passaram a contar com outras noções de espaço, antes mais ligadas à filosofia de Laban. "São outros códigos e linguagens, como os micromovimentos de Feldenkrais (na primeira etapa da oficina ministrada por Nuno Bizarro), que nos provocam a vencer preconceitos e buscar outras formas do fazer artístico", acredita Juliana, cuja mãe, a coreógrafa e professora Mônica Japiassú é uma das raras profissionas no Recife a ter feito formação em Feldenkrais (e que compareceu a dois dias de aulas). André Aguiar, do grupo Experimental, afirmou se sentir respeitado pelo trabalho, que valoriza a postura ativa dos artistas envolvidos e enfatiza as sensações, provocando os corpos a fugirem da mecanização dos movimentoscotidianos.

Incluído na programação do Ano da França no Brasil, o Articulações finaliza com o depoimento de Isabelle Launay em português - ela morou 15 anos no Brasil. João Costa Lima pontua que a conferência será feita em linguagem clara e direta, interessante até mesmo para quem deseja se iniciar nos questionamentos da dança contemporânea. "Isabelle é filósofa de estética e possui uma visão alargada da prática artística. Ela articula a vida cotidiana contemporânea com relações sociais, econômicas, antropológicas, evidenciando os fatores políticos da dança", destaca João Lima, que não descarta o desejo de voltar à cidade para compartilhar novos projetos."

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